Regra da Cadeia
Lembram da famosa regra da cadeia do cálculo 1?
$ (f \circ g)^{'}(x) = f^{'}(g(x)) g^{'}(x).$
A mesma regra vale para funções de várias variáveis, porém precisamos ter cuidado ao aplicar.
Sejam $ S, T$ subconjuntos de $ \mathbb{R}^n, \mathbb{R}^m$, respectivamente. Tomemos $ f: S \rightarrow \mathbb{R}^m$ e $g: T \rightarrow \mathbb{R}^p.$ Sejam $ a \in S$ um ponto do interior e $ b=f(a)$ um ponto do interior de $ T$. Se $ g$ e $ f$ forem diferenciáveis, respectivamente, nos pontos $ a$ e $b$, então
$ F'(a):=(g\circ f)'(a)=g'(b)\cdot f'(a)$.
Note que o produto acima é um produto de matrizes.
Observação: $ f'(a)$ é uma matriz $ m \times n$, enquanto $ g'(b)$ é uma matriz $ p \times m$, logo $(g\circ f)'(a)$ é uma matriz $ p \times n$.
Exemplo: Seja $F(u,v)=f(ue^{2uv},2v-u)$, onde $f$ é uma função diferenciável dada. Calcule $\dfrac{\partial F}{\partial u}$ e $\dfrac{\partial F}{\partial v}$.
Enxergando $F$ como $f(x,y)$ temos que $x=ue^{2uv}$ e $y=2v-u$. Tomemos $g(u,v)=(ue^{2uv},2v-u)$. Daí $F=f\circ g$. Disso segue que
$\dfrac{\partial F}{\partial u}= f_x\cdot \dfrac{\partial x}{\partial u}+f_y\cdot \dfrac{\partial y}{\partial u} =f_x(ue^{2uv},2v-u)\cdot (e^{2uv}+2vue^{2uv})+f_y(ue^{2uv},2v-u)\cdot (-1)$
e
$ \dfrac{\partial F}{\partial v}= f_x\cdot \dfrac{\partial x}{\partial v}+f_y\cdot \dfrac{\partial y}{\partial v} =f_x(ue^{2uv},2v-u)\cdot (2u^2e^{2uv})+f_y(ue^{2uv},2v-u)\cdot (2) $
(continue os cálculos)
Casos especiais de mais interesse
Seja $\gamma: I \rightarrow \mathbb{R}^2$ uma curva e $ f: \mathbb{R}^2 \rightarrow \mathbb{R}$ uma função real. Então
$ f \circ \gamma : I \rightarrow \mathbb{R}$ é uma função de uma variável real. Pela regra de cadeia
$ (f \circ \gamma)^{'}(t) = Df(\gamma(t)). D\gamma(t).$
Suponhamos que $ \gamma = (\gamma_1, \gamma_2)$. Então
$ Df(\gamma(t)) = [f_x(\gamma(t)), f_y(\gamma(t))]$ e $ D\gamma(t)$ é uma matriz $ 1\times 2$ com entradas $ \gamma_1^{'}(t), \gamma^{'}_2(t)$ e portanto usando regra de cadeia temos
$ (f\circ \gamma)^{'}(t) = f_x(\gamma(t)) \gamma_1^{'}(t) + f_y(\gamma(t)) \gamma_2^{'}(t)$ e isto pode ser escrita de uma forma mais simpática:
$ \nabla f (\gamma(t)) (\gamma_1^{'}(t), \gamma_2^{'}(t)).$
Corolário: “O vetor gradiente é ortogonal as curvas de nível”. Isto é, seja $ f: \mathbb{R}^2 \rightarrow \mathbb{R}$ uma função diferenciável e considere um ponto $ a$ pertencente a curva de nível $ c \in \mathbb{R}.$ Então pela definição da curva de nível se parametrizarmos a curva (ou considerarmos uma curva dentro da superfície de nível em geral): $ \gamma: I \rightarrow \mathbb{R}^2$ tal que $ \gamma(0)=a$, então $f \circ \gamma (t) = c$ para todo $ t \in I$ e por ser uma função constante $ f\circ \gamma$ tem derivada zero:
$ \nabla f(a) . (\gamma_1^{'}(0), \gamma_2^{'}(0)) = 0$
e isto significa que o traço da curva $ \gamma$ é ortogonal ao vetor gradiente $ \nabla f(a)$ no ponto $ \gamma(0)=a.$
Exemplo: Seja $ f : \mathbb{R}^2 \rightarrow \mathbb{R}$ dada por $ z= f(x, y)= x^2 - y^2.$ Podemos considerar coordenadas polares $ (r, \theta)$. Vamos calcular derivada de $ z$ com respeito das variáveis polares $ r, \theta.$
Bem, $ z= r^2 cos^2(\theta) - r^2 sen^{2}(\theta).$ Então:
$ \frac{\partial z}{\partial r} = 2r cos^2(\theta) - 2r sen^2(\theta)= 2r cos(2 \theta).$
$ \frac{\partial z}{\partial \theta} = -2r^2 cos(\theta)sen(\theta) - 2r^2 sen(\theta) cos(\theta)= -2r^2 sen(2 \theta). $
Agoravamos usar regra da cadeia:
$ [\frac{\partial z}{\partial r} \frac{\partial z}{\partial \theta} ] = [\frac{\partial z}{\partial x} \frac{\partial z}{\partial y}] \begin{bmatrix} \frac{\partial x}{\partial r} & \frac{\partial x}{\partial \theta} \\ \frac{\partial y}{\partial r}& \frac{\partial y}{\partial \theta} \end{bmatrix}$
Observem que:
$ \frac{\partial z}{\partial x} = 2x= 2rcos(\theta)$
$ \frac{\partial z}{\partial y} = -2y= -2r sen(\theta)$
$ \frac{\partial x}{\partial r} = cos(\theta)$
$ \frac{\partial x}{\partial \theta} = -r sen(\theta)$
$ \frac{\partial y}{\partial r} = sen(\theta)$
$ \frac{\partial y}{\partial \theta} = r cos(\theta)$
e portanto:
$ [\frac{\partial z}{\partial r} , \frac{\partial z}{\partial \theta}] = [2r cos(\theta) -2r sen(\theta)] \begin{bmatrix} cos(\theta) & -r sen(\theta) \\ sen(\theta)& r cos(\theta) \end{bmatrix} $
$ = [2r cos(2 \theta) , -2r^2 sen(2 \theta)].$
Exercício: Considere a superfície $ z=x^2 - y^2$. Interprete geometricamente $ \frac{\partial z}{\partial r} = 0$ para $ \theta= \frac{\pi}{4}.$
Exemplo: Conservação de energia
Considere um sistema regido por leis de Newton tal que no momento $ t$ esteja na posição $ (x_1, \cdots, x_n)$ e velocidade $ (v_1, \cdots , v_n).$ Por exemplo se $ k$ partículas estejam sob força de gravidade, a posição do sistema (de $ k$ partículas) é determinada por $ n=3k$ componentes de posição e $ 3k$ componentes de velocidade. Observe que $ x_1, \cdots, x_n $ e $ v_1, \cdots, v_n $ sõa funções reais de tempo $ t. $
Uma hipótese física: Existe uma função potencial que apenas depende das posições $ U = U(x_1, \cdots, x_n) $ tal que a força é dada por seguinte fórmula:
$ F = (F_1, \cdots, F_n) = (-\frac{\partial U}{\partial x_1}, \cdots, - \frac{\partial U}{\partial x_n}). $
Definimos a função de energia:
$ E(x_1, \cdots, x_n, v_1, \cdots, v_n) = U + \frac{1}{2} \sum_{i=1}^{n} m_i v_i^2 $
Aqui $ m_i $ são chamados de massa e no exemplo de $ k $ partículas, $ m_1= m_2=m_3 $ representa a massa da primeria partícula ….
A lei de conservação de energia, estabelece que apesar de que $ x_i, v_i $ variam ao longo do tempo, a energia é constante. Isto é:
$ \frac{ dE}{dt} =0. $
Basta usar regra de cadeia e
$ \frac{ dE}{dt} = \frac{\partial E}{\partial x_1} \frac{\partial x_1}{\partial t} + \cdots + \frac{\partial E}{\partial x_n} \frac{\partial x_n}{\partial t} + \frac{\partial E}{\partial v_1} \frac{\partial v_1}{\partial t} + \cdots + \frac{\partial E}{\partial v_n} \frac{\partial v_n}{\partial t}.$
Agora observe que $ \frac{\partial x_i}{\partial t} = v_i, \frac{\partial v_i}{\partial t} = a_i$ e pela lei do Newton:
$ F = (m_1 a_1, \cdots, m_n a_n)$ e temos:
$ \frac{dE}{dt}= \frac{\partial U}{\partial x_1} v_1 + \cdots + \frac{\partial U}{\partial x_n} v_n + m_1v_1a_1 + \cdots+ m_n a_n v_n=$
$ = (-m_1a_1)v_1 + \cdots+ (-m_n a_n v_n) + m_1v_1a_1 + \cdots+ m_n a_n v_n=0.$