Nesta página, discutiremos o quão parecida a relação de subgrafo (bem como a de subgrafo induzido) é com uma relação de ordem. Afinal, alguns axiomas de ordem são satisfeitos pela noção de subgrafo: um grafo é subgrafo de si mesmo, e, se $G_1$ é subgrafo de $G_2$ e $G_2$ é subgrafo de $G_3$, tem-se que $G_1$ é subgrafo de $G_3$. Porém, a propriedade anti-simétrica não é trivialmente verificada. Isto é, se $H$ é subgrafo de $G$ e $G$ é subgrafo de $H$, tem-se necessariamente que $H = G$?

Para respondermos a essa pergunta, é preciso estabelecer melhor as noções de igualdade e continência entre grafos. Nesse sentido, dizemos que uma função $\varphi : V(H)\to V(G)$ é um mergulho de um grafo $H$ em um grafo $G$ se é injetora e preserva arestas. Mais precisamente, $\varphi(u)\varphi(v)\in E(G)$ sempre que $uv\in E(H)$. Essa definição formaliza apropriadamente quando podemos dizer que $H$ é um subgrafo de $G$: basta que exista $\varphi: V(H) \to V(G)$ um mergulho. Nesse caso, escrevemos ainda $H\leq G$. A figura a seguir exemplifica esse conceito.

Nesse esboço, observe que uma aresta foi adicionada à imagem de $H$ pelo mergulho, isto é, apesar de encararmos $H$ como subgrafo de $G$, essa aplicação não nos permite enxergá-lo como subgrafo induzido. Por esse motivo, estabelecemos uma definição mais exigente. Dizemos agora que $\varphi : V(H)\to V(G)$ é um mergulho forte de um grafo $H$ em um grafo $G$ se é uma aplicação injetora que preserva arestas e não arestas. Ou seja, se $\varphi(u)\varphi(v)\in E(G)$ se, e somente se, $uv\in E(H)$. Nesse caso, escrevemos $H\unlhd G$ e destacamos que $G[\varphi(H)]$ pode ser visto como uma cópia de $H$ induzida em $G$. Em particular, todo mergulho forte é um mergulho. Com isso, adaptando a figura acima, temos o seguinte exemplo de um mergulho forte:

Inclusive, a definição de mergulho forte nos permite estabelecer quando dois grafos $G$ e $H$ são iguais. Assim, escrevemos $H = G$ se existe $\varphi : V(H) \to V(G)$ um mergulho forte que é sobrejetor (e, portanto, bijetor). Nesse caso, $\varphi$ é dito ser um isomorfismo de grafos, bem como sua inversa $\varphi^{-1}$.

Com todo esse vocabulário, podemos apropriadamente discutir o quão anti-simétricas são as relações $\leq$ e $\unlhd$. Para isso, dizemos que dois grafos $G$ e $H$ são gêmeos se $H \leq G$ e $G \leq H$, bem como são gêmeos fortes se $H \unlhd G$ e $G \unlhd H$. Em particular, a aplicação identidade em $V(G)$ verifica que $G$ é gêmeo e gêmeo forte de $G$ para qualquer que seja o grafo $G$. A unicidade desse gêmeo, inclusive, é garantida por sua eventual finitude:

Proposição: Seja $G$ um grafo finito. Então, se $H$ é gêmeo de $G$, tem-se que $H = G$. Em particular, se $H$ é gêmeo forte de $G$, tem-se também que $H=G$.

Demonstração: Dado que os grafos $G$ e $H$ são gêmeos, podemos fixar $\varphi : V(G) \to V(H)$ e $\psi : V(H) \to V(G)$ um par de mergulhos mútuos. Observamos ainda que $\varphi$ e $\psi$, por preservarem arestas, induzem naturalmente aplicações $\varphi' : E(G) \to E(H)$ e $\psi' : E(H) \to E(G)$. Mais precisamente, podemos definir $\varphi'(uv) = \varphi(u)\varphi(v) \in E(H)$ para toda aresta $uv \in E(G)$, bem como $\psi'(uv) = \psi(u)\psi(v)\in E(G)$ para toda aresta $uv \in E(H)$. Inclusive, a injetividade de $\varphi$ e $\psi$ garante que $\varphi'$ e $\psi'$ são também injetoras. Ou seja, as aplicações $\varphi$, $\varphi'$, $\psi$ e $\psi'$ são injetoras, verificando que $|V(G)|\leq |V(H)|$, $|E(G)|\leq |E(H)|$, $|V(H)|\leq |V(G)|$ e $|E(H)|\leq |E(G)|$ respectivamente. Portanto, $|V(G)| = |V(H)|$ e $|E(G)| = |E(H)|$, de maneira que, pela finitude dos conjuntos $V(G)$ e $E(H)$, tem-se que as aplicações $\varphi$ e $\varphi'$ são, na realidade, bijetoras. Em particular, a bijetividade de $\varphi'$ garante que $\varphi$ preserva arestas e não arestas, caracterizando essa aplicação como um isomorfismo entre $G$ e $H$. Em suma, $G = H$. $\square$

A hipótese da finitude de $G$ na Proposição acima, porém, não pode ser removida. Por exemplo, o produto cartesiano $\mathbb{N}\times \mathbb{N}$ munido com o conjunto de arestas $\{(i,j)(i,j+1), (i,j)(i+1,j) :i,j\in \mathbb{N}\}$ define um grafo $G$ em aspecto de grid. Por meio da adição de um quadrado com apenas um dos vértices em $G$, obtemos um gêmeo (forte, inclusive) de $G$ que não é isomorfo a ele, pois possui três vértices de grau $2$. Aliás, esse argumento nos permite criar infinitos gêmeos de $G$ diferentes, isto é, dois a dois não isomorfos: basta, para cada $n\in\mathbb{N}$, concatenar $n$ quadrados pelos seus cantos superiores direitos e “pendurá-los” pelo vértice $(0,0)$ de $G$.

Como uma construção similar, considere $G$ o grafo bipartido completo $K_{2,\mathbb{N}}$, em que $2 = \{a,b\}$ é um conjunto de dois elementos. Para cada $n\in\mathbb{N}$, defina $G_n$ a partir de $G$ ao adicionarmos um conjunto $\{v_1,v_2,\dots,v_n,v_{n+1}\}$ de $n+1$ vértices de grau $1$ como vizinhos de $a$. Por construção, $G$ se encontra mergulhado em $G_n$, mas qualquer bijeção entre $\mathbb{N}\cup \{v_1,v_2,\dots,v_n\}$ e $\mathbb{N}$ pode ser utilizada para definir um mergulho de $G_n$ e $G$. Logo, $G$ e $G_n$ são gêmeos, mas $G_n \neq G_m$ se $n\neq m$ (pois esses grafos têm quantidades diferentes de vértices de grau $1$). Por outro lado, nenhum grafo de $\{G_n\}_{n\in\mathbb{N}}$ se encontra mergulhado em $G$ por meio de um mergulho forte. Afinal, se $H \unlhd G$, tem-se que $H$ é um subgrafo bipartido completo. Desse modo, se $G \unlhd H$, o subgrafo $H$ deve ser infinito. Ou seja, $H$ é um grafo bipartido completo com uma parte tendo dois elementos e outra tendo infinitos enumeráveis, de maneira que $H = G$.

Por um argumento análogo, um grafo bipartido completo $K_{1,\mathbb{N}}$ - em que $1 = \{a\}$ é um conjunto de um elemento - tem infinitos gêmeos. Para construí-los, basta adicionar vértices de grau $0$ a $K_{1,\mathbb{N}}$ em quantidades arbitrárias. Nesse caso, porém, os gêmeos obtidos não são conexos. Inclusive, $K_{1,\mathbb{N}}$ não possui gêmeos conexos distintos de si. Por outro lado, um raio duplo $R$ é um grafo que não possui gêmeos, sejam eles conexos ou não. Afinal, todo subgrafo de $R$ não isomorfo a ele tem como componentes conexas vértices de grau $0$, caminhos finitos ou raios com uma extremidade de grau $1$.

Em resumo, os grafos apresentados estão sujeitos a uma dicotomia: ou eles não possuem gêmeos distintos de si ou possuem infinitos deles. Curiosamente, até hoje não se sabe se esse padrão é sempre verificado:

Conjectura ( Dicotomia dos Grafos Gêmeos ): Seja $G$ um grafo qualquer. Então, valem as seguintes afirmações:

  • $G$ tem infinitos gêmeos distintos de si ou não tem nenhum.
  • $G$ tem infinitos gêmeos fortes distintos de si ou não tem nenhum.
  • Se $G$ é conexo, ele tem infinitos gêmeos conexos distintos de si ou não tem nenhum.
  • Se $G$ é conexo, ele tem infinitos gêmemos fortes conexos distintos de si ou não tem nenhum.

Observamos ainda que as quatro afirmações da conjectura acima são independentes, no sentido de que uma não pode ser trivialmente deduzida a partir de outra. Mesmo assim, existem poucos resultados na literatura que apresentam conclusões parciais para esse problema. Originalmente, inclusive, ele foi proposto para árvores por Bonato e Tardif nesse paper. Mesmo nesse caso restrito, a Dicotomia dos Grafos Gêmeos é conhecida como Tree Alternative Conjecture e permanece em aberto.

Nessa página, apresentaremos um resultado positivo para a conjectura ao verificá-la para a classe de grafos rayless, isto é, grafos que não possuem raios como subgrafos. Tal prova foi elaborada por Bonato, Bruhn, Diestel e Sprüssel nesse artigo e faz uso de uma hierarquia que caracteriza essa família de grafos.

Para descrevermos essa hierarquia, é necessário empregar uma recursão transfinita para definir o rank $\mathrm{rk}(G)$ de um grafo $G$. Nesse sentido, defina $\mathrm{rk}(G) = 0$ se $G$ é um grafo finito. Dado $\alpha > 0$ um ordinal, fixe $G$ um grafo que não tem rank definido. Escreveremos então $\mathrm{rk}(G) = \alpha$ se, como na figura abaixo, existir $S\subset V(G)$ um separador finito com a seguinte propriedade:

$$(\dagger) \text{ toda componente conexa de }G\setminus S\text{ é um grafo que tem rank menor que }\alpha. $$

Nesse caso, destacamos que devem haver infinitas componentes conexas em $G\setminus S$. Isso porque, se houvessem apenas $C_1, C_2, \dots, C_n$ finitas componentes conexas em $G\setminus S$, com ranks $\beta_1,\beta_2,\dots,\beta_n$ respectivamente, a união (finita) de $S$ com os separadores dessas componentes verificaria que $\mathrm{rk}(G) \leq \max\{\beta_1,\beta_2,\dots,\beta_n\} < \alpha$. Por meio dessa recursão, não é difícil descrever alguns grafos com rank:

  • Os grafos bipartidos completos $K_{1,\mathbb{N}}$ e $K_{2,\mathbb{N}}$ possuem rank $1$, visto que a remoção de suas partes de tamanho finito faz com que as componentes conexas resultantes sejam finitas, possuindo rank $0$.
  • A árvore cujos vértices são os elementos do conjunto $\{\emptyset,\{a\}, \{a,b\}: a,b \in \mathbb{N}\}$ e as arestas são dadas pela coleção $\{\emptyset\{a\}, \{a\}\{a,b\} : a,b \in \mathbb{N}\}$ tem rank $2$. Afinal, a remoção do vértice $\emptyset$ faz com que as componentes conexas do grafo resultantes sejam cópias de $K_{1,\mathbb{N}}$, que tem rank $1$ pelo item acima. Mais geralmente, a árvore da figura abaixo, em que apenas as folhas têm grau finito, tem rank $n$:

  • Por sua vez, podemos construir um grafo de rank $\omega$ através da substituição de uma $n-$ésima folha do grafo $K_{1,\mathbb{N}}$ por um grafo de rank $n$, mantendo uma aresta entre esse novo grafo é o vértice de grau infinito de $K_{1,\mathbb{N}}$.

Estruturalmente, os grafos que possuem rank descrevem todos os grafos que não possuem raios como subgrafos, conforme aponta a Proposição a seguir. Por esse motivo, os grafos rayless podem se beneficiar de provas indutivas, como a que faremos logo mais.

Proposição: Seja $G$ um grafo qualquer. Então, $G$ possui rank se, e somente se, $G$ é rayless.

Demonstração: Inicialmente, suponha que $G$ possui rank. Por indução sobre $\mathrm{rk}(G)$, verificaremos que ele não possui raios. Para tanto, observamos primeiro que isso de fato ocorre se $\mathrm{rk}(G) = 0$, isto é, se $G$ é finito. Caso $\mathrm{rk}(G) >0$, existe $S\subset V(G)$ finito satisfazendo $(\dagger)$, de maneira que toda componente conexa de $G\setminus S$ tem rank menor que o de $G$. Isso garante que $G$ não tem raios: pela finitude de $S$, se existisse $r$ um raio em $G$, uma componente conexa de $r\setminus S$ seria um raio em alguma componente conexa de $G\setminus S$, que é rayless por hipótese indutiva.

Reciprocamente, suponha que $G$ não tem raios como subgrafos. Por outro lado, suponha também que ele não tem rank. Em particular, alguma de suas componentes conexas $C_0$ não tem rank definido. Em $C_0$, fixe um vértice $v_0$. Como $\{v_0\}$ é um separador que não satisfaz $(\dagger)$, existe $C_1$ uma componente conexa de $C_0\setminus v_0$ que também não tem rank. Fixe $v_1$ um vizinho de $v_0$ qualquer em tal componente. Como antes, $\{v_1\}$ não satisfaz a propriedade $(\dagger)$, existindo $C_2$ uma componente conexa de $C_1\setminus v_1$ que não tem rank. Em suma, se maneira indutiva, é possível construir uma sequência de grafos conexos $\{C_n\}_{n\in\mathbb{N}}$ e de vértices $\{v_n\}_{n\in\mathbb{N}}$ com as seguintes propriedades:

  • $v_n \in C_n$ para todo $n \in \mathbb{N}$.
  • $v_{n+1}$ é um vizinho de $v_n$ em uma componente conexa $C_{n+1}$ de $C_n\setminus v_n$.
  • $C_n$ não tem rank para todo $n\in\mathbb{N}$.

Contudo, $\{v_n\}_{n\in\mathbb{N}}$ descreve um raio em $G$, o que é um absurdo. $\square$

Além de hierarquizar os grafos rayless, a noção de rank se revela últil por admitir certas estimativas elementares:

Lema: Seja $G$ um grafo rayless qualquer. Então, valem as seguintes propriedades:

  1. Se $H$ é um subgrafo de $G$, tem-se que $H$ tem rank e $\mathrm{rk}(H) \leq \mathrm{rk}(G)$.
  2. Se $X\subset V(G)$ é finito, $\mathrm{rk}(G\setminus X) = \mathrm{rk}(G)$.
  3. Se $S_1,S_2\subset V(G)$ são conjuntos minimais finitos satisfazendo $(\dagger)$, então $S_1 = S_2$.

Nesse contexto, o único conjunto minimal $S\subset V(G)$ satisfazendo $(\dagger)$ é dito ser o núcleo de $G$ e denotado por $\mathrm{K}(G)$.

Demonstração: A prova da primeira afirmação é indutiva, observando que $\mathrm{rk}(H) = \mathrm{rk}(G) = 0$ se $G$ é um grafo finito e $H$ é um de seus subgrafos (sendo, portanto, também finito). Se $\mathrm{rk}(G) > 0$, fixe $S\subset V(G)$ um separador finito com a propriedade $(\dagger)$. Se $H$ é um subgrafo de $G$, destacamos que toda componente conexa de $H\setminus S$ está contida em uma componente conexa de $G\setminus S$. Então, por hipótese indutiva, toda componente conexa de $H\setminus S$ tem rank menor que o de $G$. Em particular, o rank de $H$ existe e $\mathrm{rk}(H) \leq \mathrm{rk}(G)$.

Para provarmos a segunda afirmação, observamos que $G\setminus X$ tem rank pelo enunciado $1$. Se $S\subset V(G)\setminus X$ satisfaz $(\dagger)$ para o grafo $G\setminus X$, tem-se que toda componente conexa de $G\setminus (X\cup S)$ tem rank menor que $\mathrm{rk}(G\setminus X)$. Porém, como $S\cup X$ é finito, isso verifica também que $\mathrm{rk}(G) \leq \mathrm{rk}(G\setminus X)$. Dado que $\mathrm{rk}(G\setminus X) \leq \mathrm{rk}(G)$ também pelo item anterior, obtemos que $\mathrm{rk}(G\setminus X) = \mathrm{rk}(G)$.

Para provarmos a terceira afirmação, suponha por absurdo que existem $S_1,S_2\subset V(G)$ finitos e minimais satisfazendo $(\dagger)$, mas com $S_1\neq S_2$. Em particular, pela minimalidade desses dois separadores, tem-se que $S_1 \setminus S_2 \neq \emptyset$ e $S_2\setminus S_1 \neq \emptyset$. Denote por $\mathcal{C}$ a família de componentes conexas de $G\setminus S_1$, de modo que todas elas possuem rank menor que $\alpha := \mathrm{rk}(G)$ (pois $S_1$ satisfaz $(\dagger)$). Inclusive, fixe $C_1,C_2,\dots,C_n \in \mathcal{C}$ as finitas dessas componentes que possuem elementos de $S_2$.

Tomando $v\in S_1\setminus S_2$ qualquer, a minimalidade de $S_1$ nos garante que a componente conexa $C$ de $G\setminus (S_1\setminus \{v\})$ que contém o vértice $v$ tem rank $\alpha$. Contudo, $C\setminus S_2$ é um subgrafo de $G\setminus S_2$. Assim, como $S_2$ satisfaz $(\dagger)$, a componente conexa $C'$ desse subgrafo que contém $v$ deve ter um rank $\beta < \alpha$. Porém, as componentes conexas de $G\setminus (S_1\cup S_2\setminus \{v\})$ são $C'$ e certos subgrafos de $C_1,C_2,\dots,C_n$. Logo, ao unirmos $S_1\cup S_2\setminus \{v\}$ com (finitos) separadores de $C',C_1,\dots,C_n$ que satisfazem a propriedade $(\dagger)$, obteremos um separador de $G$ que verifica que $\mathrm{rk}(G) \leq \max\{\beta, \mathrm{rk}(C_1),\mathrm{rk}(C_2),\dots,\mathrm{rk}(C_n)\} < \alpha$, o que é uma contradição. $\square$

Com a noção de núcleo, por sua vez, é possível encontrar conjuntos fixos por mergulhos mútuos em grafos rayless gêmeos. Mais precisamente, temos:

Proposição: Sejam $G$ e $H$ grafos rayless gêmeos. Tem-se então que $\mathrm{rk}(G) = \mathrm{rk}(H)$. Mais do que isso, se $\varphi : V(G)\to V(H)$ e $\psi : V(H)\to V(G)$ são mergulhos, $\varphi(\mathrm{K}(G)) = \mathrm{K}(H)$ e $\psi(\mathrm{K}(H)) = \mathrm{K}(G)$.

Demonstração: Se $G$ e $H$ são gêmeos e $\varphi : V(G)\to V(H)$ e $\psi : V(H)\to V(G)$ são mergulhos mútuos que verificam isso, podemos identificar $G$ e $H$ com os subgrafos (não necessariamente induzidos) $\varphi(G)$ e $\psi(H)$ de $H$ e $G$ respectivamente. Em particular, $\mathrm{K}(\varphi(G)) = \varphi(\mathrm{K}(G))$ e $\mathrm{K}(\psi(H)) = \psi(\mathrm{K}(H))$.

Como $\psi(H)$ é subgrafo de $G$ e $\varphi(G)$ é subgrafo de $H$, o Lema anterior nos garante que $\mathrm{rk}(H) \leq \mathrm{rk}(G)$ e $\mathrm{rk}(G)\leq \mathrm{rk}(H)$. Isto é, $\mathrm{rk}(G) = \mathrm{rk}(H)$. Mais do que isso, $\varphi(G) \cap \mathrm{K}(H)$ satisfaz $(\dagger)$ e verifica que $G = \varphi(G)$ tem um rank, bem como $\psi(H)\cap \mathrm{K}(G)$ satisfaz $(\dagger)$ para verificar que $H = \psi(H)$ tem rank. Logo, pela minimalidade dos núcleos, tem-se que $\mathrm{K}(\psi(H)) \subset \psi(H)\cap \mathrm{K}(G) \subset \mathrm{K}(G)$ e $\mathrm{K}(\varphi(G)) \subset \varphi(G)\cap \mathrm{K}(H) \subset \mathrm{K}(H)$. Em resumo, $\varphi(\mathrm{K}(G))\subset \mathrm{K}(H)$ e $\psi(\mathrm{K}(H))\subset \mathrm{K}(G)$. Visto que as funções $\psi$ e $\varphi$ são injetoras e os separadores $\mathrm{K}(G)$ e $\mathrm{K}(H)$ são finitos, essas continências são, na realidade, igualdades. $\square$

A partir de agora, introduziremos algumas notações convenientes para verificar a Dicotomia dos Grafos Gêmeos para a classe dos grafos rayless. Essa principal demonstração se baseará numa indução no rank do grafo, mas, para que ela seja bem sucedida, é necessário que a hipótese indutiva seja ligeiramente mais forte que a tese que queremos a princípio. Por esse motivo, dados $G$ e $H$ grafos e distinguidos dois suconjuntos finitos de vértices $X\subset V(G)$ e $Y\subset V(H)$, convencionamos que:

  • Um mergulho do par $(G,X)$ no par $(H,Y)$, denotado por $\varphi : (G,X) \to (H,Y)$, é um mergulho $\varphi : V(G) \to V(H)$ como definido anteriormente, mas com $\varphi(X)\subset Y$.
  • Um mergulho forte do par $(G,X)$ no par $(H,Y)$, denotado por $\varphi : (G,X) \to (H,Y)$, é um mergulho forte $\varphi : V(G) \to V(H)$ como definido anteriormente, mas com $\varphi(X)\subset Y$.
  • Os pares $(G,X)$ e $(H,Y)$ são gêmeos se existem mergulhos de pares $\varphi : (G,X)\to (H,Y)$ e $\psi : (H,Y)\to (G,X)$. Nesse caso, a finitude de $X$ e $Y$ nos garante que $\varphi(X) = Y$ e $\psi(Y) = X$.
  • Os pares $(G,X)$ e $(H,Y)$ são gêmeos fortes se existem mergulhos fortes de pares $\varphi : (G,X)\to (H,Y)$ e $\psi : (H,Y)\to (G,X)$. Novamente, a finitude de $X$ e $Y$ nos garante que $\varphi(X) = Y$ e $\psi(Y) = X$.
  • Os pares $(G,X)$ e $(H,Y)$ são isomorfos se existe $\varphi : V(G) \to V(H)$ um isomorfismo com $\varphi(X) = Y$, denotado também por $\varphi: (G,\overline{X})\to (H,\overline{Y})$.

No caso de $(G,X)$ e $(H,Y)$ serem pares gêmeos, a Proposição acima nos garante que, se $\varphi : (G,X) \to (H,Y)$ e $\psi : (H,Y)\to (G,X)$ são mergulhos mútuos, então, mais do que $\varphi(X) = Y$ e $\psi(Y) = X$, tem-se que $\varphi(X\cup \mathrm{K}(G)) = Y\cup \mathrm{K}(H)$ e $\psi(Y\cup \mathrm{K}(H)) = X\cup \mathrm{K}(G)$. Por esse motivo, denotamos $\overline{X} = X\cup \mathrm{K}(G) $ e $\overline{Y} = Y\cup \mathrm{K}(H)$. Mais do que isso, como $(\psi \circ \varphi)|_{\overline{X}}$ é uma injeção (e portanto uma bijeção) do conjunto $\overline{X}$ sobre si mesmo, existe $n \in \mathbb{N}$ de modo que $(\psi \circ \varphi)^n$ é a aplicação identidade em $\overline{X}$. Logo, a menos de trocar o mergulho $\psi : (H,Y)\to (G,X)$ por $(\psi \circ \varphi)^{n-1}\circ \psi$, podemos sempre supor que $\varphi|_{\overline{X}}$ e $\psi|_{\overline{Y}}$ são aplicações inversas uma da outra.

Similarmente, suponha que exista uma bijeção $\eta : X \to Y$ entre os subconjuntos $X\subset V(G)$ e $Y\subset V(H)$. Dizemos assim que os pares $(G,X)$ e $(H,Y)$ são $\eta-$equivalentes se existe $\varphi : (G,X) \to (H,Y)$ um isomorfismo de grafos tal que $\varphi|_X = \eta$. Nesse caso, abusando da notação, escrevemos $(G,X)\simeq_{\eta} (H,Y)$ e $(H,Y)\simeq_{\eta^{-1}}(G,X)$.

Mais especificamente, se $G$ é um grafo rayless e $X\subset V(G)$ é um conjunto finito qualquer, denotamos por $\mathcal{C}_G$ a família dos grafos da forma $G[C\cup \overline{X}]$, em que $C$ é uma componente conexa de $G\setminus \overline{X}$. Note que, como $\mathrm{K}(G)\subset\overline{X}$, todas essas componentes têm rank menor que $\mathrm{rk}(G)$, bem como os elementos de $\mathcal{C}_G$ propriamente. A figura abaixo exemplifica como são os elementos de $\mathcal{C}_G$.

Fixado $A\in \mathcal{C}_G$, representaremos por $I_G(A)$ a coleção de todos os outros grafos de $\mathcal{C}_G$ que são $\textrm{id}-$equivalentes a $A$, em que $\mathrm{id}:\overline{X}\to\overline{X}$ é a aplicação identidade. Explicitamente, $I_G(A) = \{D\in\mathcal{C}_G : (A,\overline{X})\simeq_{\mathrm{id}}(D,\overline{X})\}$ e a definição desse conjunto nos é relevante por permitir caracterizar quando dois pares $(G,\overline{X})$ e $(H,\overline{Y})$ são isomorfos:

Lema ( Decomposição de Isomorfismos ): Sejam $G$ e $H$ grafos rayless e fixe $X\subset V(G)$ e $Y\subset V(H)$ conjuntos finitos. Então, $(G,\overline{X})$ e $(H,\overline{Y})$ são isomorfos se, e somente se, existirem $\eta : \overline{X}\to\overline{Y}$ e $\alpha : \mathcal{C}_G\to \mathcal{C}_H$ tais que:

  1. $\eta$ é um isomorfismo entre os grafos $G[\overline{X}]$ e $H[\overline{Y}]$.
  2. $\alpha$ é uma bijeção de forma que, para todo $A\in \mathcal{C}_G$, tem-se que $(A,\overline{X})\simeq_{\eta}(\alpha(A),\overline{Y})$ e $|I_G(A)| = |I_H(\alpha(A))|$.

Antes de demonstrarmos esse Lema propriamente, descreveremos seu enunciado de uma forma mais informal. Ele diz que, para que os pares $(G,\overline{X})$ e $(H,\overline{X})$ sejam isomorfos, é suficiente (além de necessário) que exista um isomorfismo que identifica os grafos finitos $G[\overline{X}]$ e $H[\overline{Y}]$ e que a quantidade de cópias de um elemento $A\in \mathcal{C}_G$ em $\mathcal{C}_G$ é, por meio dessa identificação $\eta$, igual a quantidade de suas cópias em $\mathcal{C}_H$. A figura abaixo exemplifica essa descrição.

Demonstração do Lema: Primeiramente, suponha que existam $\eta$ e $\alpha$ como no enunciado. Em particular, para cada $A\in \mathcal{C}_G$, é possível encontrar um isomorfismo de grafos $\varphi_A : V(A) \to V(\alpha(A))$ tal que $\varphi_A|_{\overline{X}} = \eta$. Com isso, defina um isomorfismo $\varphi : V(G) \to V(H)$ pondo $\varphi(v) = \eta(v)$ se $v\in \overline{X}$ e $\varphi(v) = \varphi_A(v)$ se o elemento de $\mathcal{C}_G$ que contém o vértice $v\in V(G)\setminus \overline{X}$ é $A$. Observamos que a bijetividade de $\varphi$ é garantida pela bijetividade de $\alpha$.

Reciprocamente, suponha que existe $\varphi : (G,\overline{X})\to (H,\overline{Y})$ um isomorfismo de grafos. Naturalmente, consideramos $\eta = \varphi|_{\overline{X}}$. Além disso, definimos $\alpha : \mathcal{C}_G\to \mathcal{C}_H$ pondo, para todo $A\in \mathcal{C}_G$, $\alpha(A)$ como o único elemento de $\mathcal{C}_H$ que contém os vértices de $\varphi(A)$. A boa definição de $\alpha$, assim como sua bijetividade, segue diretamente do fato de que $\varphi$ é um isomorfismo de grafos. Além disso, tem-se que, para todo $A\in \mathcal{C}_G$ e todo $D\in I_G(A)$, o seguinte diagrama comuta:

Logo, $\alpha(D)\in I_H(\alpha(A))$. Da mesma forma, se $D\in I_H(\alpha(A))$, tem-se que $\alpha^{-1}(D) \in I_G(A)$. Isso verifica, portanto, que $|I_G(A)| = |I_H(\alpha(A))|$, para qualquer que seja $A\in\mathcal{C}_G$. $\square$

Finalmente, podemos enunciar o resultado parcial da Dicotomia dos Grafos Gêmeos que estamos interessados em abordar. Para tanto, apenas destacamos que um par $(G,X)$ - em que $G$ é um grafo e $X\subset V(G)$ é finito - é dito ser conexo se $G\setminus X$ é um grafo conexo. Nesse sentido, temos:

Teorema: Sejam $G$ e $H$ grafos rayless e fixe $X\subset V(G)$ e $Y\subset V(H)$ conjuntos finitos. Se $(H,Y)$ é um gêmeo não isomorfo a $(G,X)$, então $(G,X)$ tem infinitos gêmeos dois a dois distintos não isomorfos a si. Mais do que isso, esses gêmeos podem ser escolhidos como sendo conexos se $(G,X)$ for também conexo.

Antes de inicarmos a demonstração, observamos que, ao fazermos $X=Y=\emptyset$, obtemos exatamente o enunciado da Dicotomia dos Grafos Gêmeos, exceto pelas afirmações referentes a gêmeos fortes. Entretanto, a demonstração do Teorema acima para o caso em que $(H,Y)$ é um gêmeo forte do par $(G,X)$ e a ele não isomorfo, permitindo-nos obter infinitos gêmeos fortes não isomorfos desses pares, é similar à que será apresentada e foi feita nesse artigo já referenciado.

Demonstração: A demonstração será feita por indução no rank do grafo $G$, observando que, no caso em que $\mathrm{rk}(G) = 0$, esse grafo é finito e, portanto, não possui gêmeos diferentes de si. Suponha então que $\mathrm{rk}(G) > 0$ e que o resultado se verifica para grafos de rank menor.

Inicialmente, abordaremos o caso em que algum elemento $C_0 \in \mathcal{C}_G$ é tal que $(C_0,\overline{X})$ possui um gêmeo conexo não isomorfo a si. Pela hipótese indutiva, portanto, existe $\{(C_i,X_i): i\in \mathbb{N}\}$ uma família infinita de gêmeos conexos distintos do par $(C_0,\overline{X})$. Conforme destacamos anteriormente, é possível identificar $X_i$ e $\overline{X}$ por meio de mergulhos mútuos de $(C_i,X_i)$ e $(C,\overline{X})$ que são inversos um do outro quando restritos a $X_i$ e $\overline{X}$. Agora, considere $\mathcal{T}$ a coleção de todos os elementos de $\mathcal{C}_G$ da forma $(A,\overline{X})$ que são $\mathrm{id}-$equivalentes a $(C_0,\overline{X})$ ou gêmeos desse par. Definindo um grafo rayless $G_i$, troque cada elemento de $\mathcal{T}$ por uma cópia de $(C_i,\overline{X})$. Observamos que $(G_i,X)$ é conexo se $(G,X)$ o era. Mais do que isso, é possível mergulhar $(G_i,\overline{X})$ em $(G,\overline{X})$ e vice versa por meio de:

  • Aplicações identidades em $\overline{X}$ e nas componentes de $\mathcal{C}_G\setminus \mathcal{T}$, que foram mantidas na definição de $G_i$.
  • Isomorfismos ou mergulhos mútuos entre $(G_i,\overline{X})$ e elementos de $\mathcal{T}$, cujas existências são garantidas pela própria definição de $\mathcal{T}$.

A figura abaixo exemplifica como são tomados esses mergulhos mútuos, concluindo que os pares $(G_i,\overline{X})$ e $(G,\overline{X})$ são gêmeos para todo $i\in \mathbb{N}$.

Pela definição de $\mathcal{T}$, por sua vez, um isomorfismo $\varphi : V(G_i)\to V(G_j)$ entre $(G_i,\overline{X})$ e $(G_j,\overline{X})$ não pode induzir em $\overline{X}$ a aplicação identidade se $i\neq j$. Caso contrário, esse isomorfismo levaria elementos de $\mathcal{T}$ de $(G_i,\overline{X})$ em elementos de $\mathcal{T}$ de $(G_j,\overline{X})$, estabelecendo um isomorfismo entre $(C_i,\overline{X})$ e $(C_j,\overline{X})$ (que não existe por hipótese). Consequentemente, $(G_i,\overline{X})$ pode ser isomorfo a apenas finitos outros pares da forma $(G_j,\overline{X})$. Afinal, se houvessem em $\{(G_j,\overline{X}): j \in \mathbb{N}\}$ infinitas cópias de $(G_i,\overline{X})$, infinitos desses isomorfismos, pelo Princípio da Casa dos Pombos, induziriam uma mesma bijeção $\eta : \overline{X}\to \overline{X}$. Entretanto, se $j,k\in\mathbb{N}$ são distintos tais que $(G_i,\overline{X})\simeq_{\eta}(G_j,\overline{X})$ e $(G_i,\overline{X})\simeq_{\eta} (G_k,\overline{X})$, tem-se que $(G_j,\overline{X})\simeq_{\mathrm{id}}(G_k,\overline{X})$, o que é um absurdo. Consequentemente, é possível extrair de $\{(G_i,\overline{X}): i \in \mathbb{N}\}$ uma subfamília infinita $\{(G_{i_n}, \overline{X}):n\in\mathbb{N}\}$ de elementos dois a dois não isomorfos. Isto é, esses pares são infinitos gêmeos distintos de $(G,\overline{X})$. Nessa construção, porém, destacamos que sequer utilizamos o fato de que $(H,\overline{Y})$ é um gêmeo distinto de $(G,\overline{X})$.

Então, a partir de agora é possível supor que nenhum elemento de $\mathcal{C}_G$ possui um gêmeo distinto de si. Da mesma maneira, podemos supor que nenhum elemento de $\mathcal{C}_H$ possui um gêmeo diferente de si. Dessa vez, fixe $\varphi : (G,\overline{X})\to (H,\overline{Y})$ e $\psi : (H,\overline{Y})\to (G,\overline{X})$ um par de mergulhos mútuos, supondo ainda que $(\psi \circ \varphi)|_{\overline{X}}$ é a função identidade. Assim, defina a função shift em $G$ como a aplicação $\mathfrak{s}_G : \mathcal{C}_G \to \mathcal{C}_G$ que leva uma componente conexa $(C,\overline{X})$ na (única) componente conexa $(D,\overline{X})$ tal que $(\psi\circ\varphi)(C)\subset D$. Da mesma forma, considere o shift em $H$ como a aplicação $\mathfrak{s}_H : \mathcal{C}_H \to \mathcal{C}_H$ que mapeia um par $(C,\overline{Y})\in\mathcal{C}_G$ no (único) par $(D,\overline{Y})\in\mathcal{C}_H$ tal que $(\varphi \circ \psi)(C)\subset D$. Nesse contexto, mostraremos que vale uma das seguintes afirmações:

  1. Existe $(A,\overline{X})\in\mathcal{C}_G$ que não é $\mathrm{id}-$equivalente a $(\mathfrak{s}_G(A),\overline{X})$. Além disso, se $\mathcal{A}$ é a coleção (não vazia, portanto) de todos os elementos de $I_G(A)$ que não são $\mathrm{id}-$equivalentes a seu shift, podemos tomar $|\mathcal{A}| = |I_G(A)|$ caso $I_G(A)$ seja infinito.
  2. Existe $(A,\overline{Y})\in\mathcal{C}_H$ que não é $\mathrm{id}-$equivalente a $(\mathfrak{s}_H(A),\overline{Y})$. Além disso, se $\mathcal{A}$ é a coleção (não vazia, portanto) de todos os elementos de $I_H(A)$ que não são $\mathrm{id}-$equivalentes a seu shift, podemos tomar $|\mathcal{A}| = |I_H(A)|$ caso $I_H(A)$ seja infinito.

Por um momento, suponha que nenhuma dessas afirmaçoes se verifica. Em particular, dado $A\in \mathcal{C}_G$ - a menos de trocá-lo por um elemento de $I_G(A)\setminus \mathcal{A}$ - podemos supor que ele é $\mathrm{id}-$equivalente a seu shift. Isto é, existe $\gamma : (A,\overline{X})\to (\mathfrak{s}_G(A),\overline{X})$ um isomorfismo de grafos que é a aplicação identidade quando restrito a $\overline{X}$. Se $D\in \mathcal{C}_H$ é tal que $\varphi(A)\subset D$, porém, $\varphi : (A,\overline{X})\to (D,\overline{Y})$ e $\gamma^{-1}\circ \psi : (D, \overline{Y})\to (A,\overline{X})$ são mergulhos mútuos. Isto é, $(A,\overline{X})$ e $(D,\overline{Y})$ são grafos gêmeos, devendo ser iguais (pois estamos analisando o caso em que nenhum elemento de $\mathcal{C}_G$ tem gêmeo distinto de si). Consequentemente, não pode haver $B\in I_G(A)\setminus \{A\}$ de forma que $\varphi(B)\subset \varphi(A)$. Caso contrário, $\varphi(A)\setminus \overline{X}$ e $\varphi(B)\setminus \overline{X}$ seriam cópias disjuntas (não induzidas) do grafo $A\setminus \overline{X}$ em $D\setminus \overline{Y}$, pois $\varphi$ é uma aplicação injetiva. Porém, $D\setminus \overline{X}$ é isomorfo ao próprio grafo $A\setminus \overline{X}$, mostrando que $A\setminus \overline{X}$ é um grafo conexo que contém duas cópias disjuntas de si mesmo, devendo ter um raio.

Em resumo, essa argumentação verifica que $\varphi$ leva elementos distintos de $I_G(A)\setminus \mathcal{A}$ em elementos distintos de $I_H(D)$. Isto é, $|I_G(A)| = |I_G(A)\setminus \mathcal{A}| \leq |I_H(D)|$. Por simetria, então, obtém-se também que $|I_H(D)|\leq |I_G(A)|$. Ou seja, verificamos que, para todo $A\in \mathcal{C}_G$, a quantidade de elementos de $\mathcal{C}_G$ que são $\textrm{id}-$equivalentes a $A$ é a mesma quantidade de elementos de $\mathcal{C}_H$ que também o são (por meio da identificação $\varphi|_{\overline{X}}: \overline{X}\to \overline{Y})$. Pelo Lema da Decomposição de Isomorfismos, portanto, $(G,\overline{X})$ e $(H,\overline{Y})$ devem ser isomorfos, contradizendo a principal hipótese sobre esses pares.

Portanto, sem perda de generalidade, podemos assumir que a primeira afirmação se verifica. Se $A$ e $\mathcal{A}$ são como dados por ela, mostraremos que a órbita $\{\mathfrak{s}_G^n(D)\}_{n \geq 1}$ não intersecta $I_G(A)$, para todo $D\in\mathcal{A}$. Por um momento, suponha que isso não ocorre. Logo, existe $n \geq 1$ tal que $(A,\overline{X})\simeq_{\mathfrak{id}} (\mathfrak{s}_G^n(D),\overline{X})$. Isto é, existe $\varphi : (A,\overline{X})\to (\mathfrak{s}_G^n(D),\overline{X})$ um isomorfismo de grafos que é a identidade se restrito a $\overline{X}$. Uma vez que $\mathfrak{s}_G(D)\notin I_G(A)$ pela definição de $\mathcal{A}$, devemos ter $n \geq 2$. Ainda, como $D\in \mathcal{A}\subset I_G(A)$, fixe $\psi : (D,\overline{X})\to (A,\overline{X})$ um isomorfismo com $\psi|_{\overline{X}} =\mathrm{id}$. Nesse caso, contudo, $\mathfrak{s}_G \circ \psi^{-1}: (A,\overline{X})\to (\mathfrak{s}_G(D),\overline{X})$ e $\varphi^{-1}\circ \mathfrak{s}_G^{n-1}: (\mathfrak{s}_G(D),\overline{X})\to (A,\overline{X})$ são mergulhos que atestam que $(A,\overline{X})$ e $(\mathfrak{s}_G(D),\overline{X})$ são gêmeos. Pelo caso que estamos analisando, porém,$(A,\overline{X})$ e $(\mathfrak{s}_G(A),\overline{X})$ devem ser isomorfos. Como o isomorfismo que atesta isso pode ser escolhido de forma a ser idêntico em $\overline{X}$, contradizemos a escolha de $D$ como elemento de $\mathcal{A}$.

Com base nessa observação, iremos decompor a coleção $\mathcal{C}_G$ nos seguintes três conjuntos:

  • $\mathcal{A}$ é como na sentença $1$ anterior.
  • $\mathcal{A}^-$ denota a coleção de elementos $D \in \mathcal{C}_G$ tais que $\mathfrak{s}_G^n(D)\in I_G(A)$ para algum $n\geq 1$. Em particular, pela definição de $\mathcal{A}$, tem-se que $I_G(A)\setminus \mathcal{A}\subset \mathcal{A}^-$.
  • $\mathcal{A}^+ = \mathcal{C}_G\setminus (\mathcal{A}\cup \mathcal{A}^-)$. Ou seja, elementos de $\mathcal{A}^+$ são os elementos de $\mathcal{C}_G$ que não são $\mathrm{id}-$equivalentes a $A$ e que nunca o serão pela composição iterada de $\mathfrak{s}_G$. Assim, pela escolha de $\mathcal{A}$ e pela observação do parágrafo anterior, tem-se que $\mathfrak{s}_G(A)\subset \mathcal{A}^+$. Também decorre imediatamente da definição de $\mathcal{A}^+$ sua invariância pelo shift, isto é, $\mathfrak{s}_G(\mathcal{A}^+)\subset \mathcal{A}^+$.

A figura abaixo esboça essa partição de $\mathcal{C}_G$ e sua relação com a dinâmica do shift.

Além disso, como a aplicação $\mathfrak{s}_G : \mathcal{C}_G \to \mathcal{C}_G$ é um mergulho, podemos definir um novo mergulho $\gamma : (G,\overline{X})\to (G,\overline{X})$ pondo: $\gamma(v) = v$ se $v\in \displaystyle\overline{X}\cup\bigcup_{D\in \mathcal{A}^-}D$ e $\gamma(v) = \mathfrak{s}_G(v)$ se $v\in \displaystyle \bigcup_{D\in \mathcal{A}\cup \mathcal{A}^+}D$. Observe ainda que, como esboçado pela figura abaixo, a imagem de $\gamma$ não intersecta $D\setminus \overline{X}$ se $D\in \mathcal{A}$.

Finalmente, somos capazes de construir gêmeos para $(G,\overline{X})$. Isso, contudo, será feito mediante os dois casos a seguir:

  1. Primeiramente, suponha que $I_G(A)$ é um conjunto finito. Nesse caso, defina $G_1$ como o grafo obtido a partir de $G$ com a adição em $\mathcal{C}_G$ de uma cópia $A'$ de $A$ que é $\mathrm{id}-$equivalente a ela por meio de um isomorfismo $\alpha : (A',\overline{X})\to (A,\overline{X})$. Por ser construído a partir de $G$ pela adição de alguns vértices, tem-se naturalmente que $(G,\overline{X})$ está mergulhado em $(G_1,\overline{X})$. Porém, é possível também mergulhar $(G_1,\overline{X})$ em $(G,\overline{X})$, bastando estender $\gamma$ para $A'$ pondo $\gamma(v) = \alpha(v)$ se $v\in A'$. Note que, como $\alpha(A') = A\in\mathcal{A}$, a aplicação $\gamma$ continua sendo injetora. Em resumo, $(G,\overline{X})$ e $(G_1,\overline{X})$ são grafos gêmeos, mas $G_1$ possui uma cópia de $A$ - $\textrm{id}-$equivalente a essa componente - a mais. Ao fazermos essa construção indutivamente, portanto, é possível encontrar $(G_n,\overline{X})$ um par gêmeo de $(G,\overline{X})$ com $n$ cópias a mais da componente $A\in \mathcal{C}_G$. Em particular, pelo Lema da Decomposição de Isomorfismos, é possível extrair de $\{(G_n,\overline{X}): n \geq 1\}$ uma subcoleção infinita de gêmeos dois a dois não isomorfos de $(G,\overline{X})$. Afinal, $(G_n,\overline{X})$ e $(G_m,\overline{X})$ não podem ser isomorfos por um isomorfismo que é a aplicação identidade quando restrita a $\overline{X}$, mas a quantidade de bijeções de $\overline{X}$ em $\overline{X}$ é finita.
  2. Suponha agora que $I_G(A)$ é infinito, de modo que $|I_G(A)| = |\mathcal{A}|$. Arbitrariamente, então, fixe $\{A_n\}_{n\in\mathbb{N}}$ uma coleção enumerável de elementos de $I_G(A)$. Assim, para cada $n\in\mathbb{N}$, considere $G_n$ o grafo obtido pela remoção de todas as componentes do conjunto $\{A_m \setminus \overline{X}: m > n\}$. Em particular, se $m$ e $n$ são distintos, tem-se que a quantidade de elementos de $\mathcal{C}_{G_n}$ que são $\mathrm{id}-$equivalentes a $A$ é diferente da quantidade de elementos de $\mathcal{C}_{G_m}$ que o são. Assim, pelo Lema da Decomposição de Isomorfismos, $(G_n,\overline{X})$ e $(G_m,\overline{X})$ não são isomorfos por meio de uma aplicação que é a função identidade quando restrita a $\overline{X}$. Consequentemente, $(G_n,\overline{X})$ é isomorfo a apenas finitos outros elementos de $\{(G_i,\overline{X}) : i \geq 1\}$, sendo possível encontrar $\{(G_{n_i},\overline{X}) : i \in \mathbb{N} \}$ uma coleção infinita de grafos dois a dois não isomorfos. Basta, portanto, mostrarmos que $(G_n,\overline{X})$ é um gêmeo de $(G,\overline{X})$ para todo $n\in\mathbb{N}$. Nessa direção, observamos primeiro que $G_n$ é definido como subgrafo de $G$, existindo naturalmente um mergulho de $(G_n,\overline{X})$ em $(G,\overline{X})$. Agora, fixando $\alpha : I_G(A)\to \mathcal{A}$ uma bijeção qualquer, considere o mergulho $\gamma : (G,\overline{X})\to (G,\overline{X})$ definido da seguinte maneira:
    • $\gamma(v) = v$ se $v\in \overline{X}$ ou $v\in D$ para alguma componente $D\in \mathcal{A}^-\setminus I_G(A)$.
    • $\gamma(v) = \mathfrak{s}_G(v)$ se $v\in D$ para alguma componente $D\in \mathcal{A}\cup \mathcal{A}^+$.
    • $\gamma(v) = \varphi_D(v)$ se $v$ é elemento de uma componente de $I_G(A)\setminus \mathcal{A}$, em que $\varphi_D : (D,\overline{X})\to (\alpha(D),\overline{X})$ é algum isomorfismo de grafos com $\varphi_D|_{\overline{X}} =\mathrm{id}$.

Com isso, observe que $\gamma\left(\bigcup I_G(A)\right) \subset \mathcal{A}\cup \mathcal{A}^+$. Dessa forma, conforme ilustrado pela figura abaixo, a aplicação $\gamma^2$ mergulha o par $(G,\overline{X})$ no par $(G_n,\overline{X})$, para qualquer $n\in\mathbb{N}$. Isso finaliza a verificação de que, para todo $n\in\mathbb{N}$, os pares $(G_n,\overline{X})$ e $(G,\overline{X})$ são gêmeos.

$\square$

Por fim, destacamos que a definição de gêmeo de um grafo se assemelha com uma propriedade de Bernstein-Schröder, em alusão ao seguinte clássico resultado de Fundamentos de Matemática:

Teorema ( Cantor-Bernstein-Schröder ): Sejam $X$ e $Y$ conjuntos. Se existem $f: X \to Y$ e $g : Y \to X$ funções injetoras, então existe $h : X \to Y$ uma bijeção.

Conforme destacado aqui, em diversas áreas da matemática existem problemas que visam estudar se dois objetos são iguais dado que em um se encontra algo semelhante ao outro. Nessa direção, a noção de gêmeo é talvez a que mais se aproxima de uma definição “do tipo Bernstein-Schroeder” na Teoria dos Grafos. Mesmo assim, a título de curiosidade, mencionamos abaixo dois outros resultados relacionados a grafos que podem ser encarados como análogos do Teorema de Cantor-Bernstein-Schroeder.

O primeiro deles diz respeito a quando é possível encarar um conjunto de vértices dentro de outro em um grafo por meio de caminhos disjuntos. Assim como no Teorema de Cantor-Bernstein-Schroeder, uma demonstração do Teorema a seguir pode ser encontrada sem o auxílio do Axioma da Escolha, como feito por Diestel e Thomassen neste paper.

Teorema: Sejam $G$ um grafo qualquer e $A_0,A_1\subset V(G)$ subconjuntos disjuntos. Suponha que, para cada $i=0,1$, existe uma coleção de caminhos disjuntos cujas pontas estão precisamente em $A_0$ e $A_1$, e tal que todo vértice de $A_i$ é extremidade de uma desses caminhos. Então, existe uma coleção de caminhos disjuntos cujas pontas estão precisamente em $A_0$ e $A_1$ e de forma que todo elemento de $A_0\cup A_1$ é ponta de algum desses caminhos.

O resultado a seguir, por sua vez, diz respeito a quando é possível encontrar árvores geradoras que, apesar de disjuntas nas arestas, as cobrem:

Teorema: Considere $\lambda$ um cardinal infinito. Então, um grafo $G$ admite $\lambda$ árvores geradoras disjuntas nas arestas e $\lambda$ árvores geradoras que as cobrem se, e somente se, $G$ admite $\lambda$ árvores geradoras (simultaneamente) disjuntas nas arestas e que as cobrem.

Esse resultado, que pode ser encontrado aqui, é de autoria de Erde, Gollin, Jóo, Knappe e Pitz. Inclusive, esses autores destacam que, para $\lambda$ é finito, a sentença acima é um problema em aberto.

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