Comentários adicionais:
A família de forcings de Jech, parametrizada pelo cardinal \(\kappa\) como no exercício acima, tem a propriedade interessante de produzir árvores de Suslin em suas extensões genéricas. Nos próximos parágrafos, vamos mostrar como isso é feito. Para tanto, primeiro é necessário definir essas árvores e estabelecer algumas convenções. Assim, fixado um cardinal regular não enumerável \(\kappa\), uma
\(\kappa-\)árvore de Suslin é uma árvore \((T,\preceq)\) que satisfaz os seguintes axiomas:
- \(T\) tem altura \(\kappa\), mas todos os seus níveis têm tamanho menor que \(\kappa\);
- Todas as cadeias e anticadeias de \(T\) possuem tamanho menor que \(kappa\). Para evitarmos confusões futuras, relembramos que uma anticadeia em uma árvore corresponde a um subconjunto de \(T\) cujos elementos são dois a dois incomparáveis com respeito a \(\preceq\).
Em geral, uma \(\omega_1-\)árvore de Suslin é dita ser simplesmente uma árvore de Suslin, e pode ser obtida, por exemplo, ao assumirmos o princípio \(\diamond\). Inclusive, o forcing \(\mathrm{Fn}_{\omega_1}(\omega_1,2)\), que verifica a consistência desse princípio, também mostrar que a existência de árvores de Suslin é consistente com \(\mathrm{ZFC}\). Porém, ordens similares a essas não identificam \(\kappa-\)árvores de Suslin se \(\kappa > \omega_1\), exigindo técnicas alternativas. Para argumentarmos como o forcing de Jech é útil nesse contexto, fixaremos \(\kappa\) um cardinal regular não enumerável e consideraremos \(\mathbb{P}\) como a ordem definida no exercício acima. Em particular, vale a seguinte observação:
Afirmação: \(\mathbb{P}\) preserva cardinais menores ou iguais a \(\kappa\), isto é, \(1\Vdash \dot{\delta} = \check{\delta}\) para todo cardinal \(\delta \leq \kappa\).
Prova: Cardinais enumeráveis são preservamos por absolutividade. Para concluir que os demais cardinais são preservados, por sua vez, basta mostrar que cofinalidades no máximo \(\kappa\), ao menos, são preservadas. De fato, seja \(\alpha\leq \kappa\) um ordinal e considere \(\beta\) sua cofinalidade. Se \(\check{\beta}\) não é a cofinalidade de \(\check{\alpha}\), então existe \(\dot{f}\) um nome e \(q\in \mathbb{P}\) tais que \(q\Vdash \dot{f}:\check{\delta}\to \check{\alpha} \text{ é cofinal} \), para algum cardinal \(\delta < \beta \leq \kappa\). Porém, pelo exercício anterior, \(p\Vdash \dot{f} = \check{g}\) para certos \(p \in \mathbb{P}\) e certa aplicação \(g : \delta \to \alpha\). Isto é, por absolutividade da definição de cofinalidade, \(g\) é uma função cofinal de \(\delta\) em \(\alpha\), contradizendo o fato de que \(\beta\) é a cofinalidade de \(\alpha\). \(\square\)
Logo, nas discussões que se seguem, podemos ignorar os símbolos \(\dot{\phantom{o}}\) e \(\check{\phantom{o}}\) sobre cardinais menores ou iguais a \(\kappa\). Assim, seja \(\dot{G}\) o filtro genérico obtido pelo forcing \(\mathbb{P}\) e, pelo princípio do máximo, considere \(\check{T}\) o nome \(\check{T} = \bigcup \check{G}\). Simplesmente por ser um filtro, \(\check{T}\) está bem definida como uma subárvore de \(^{<\kappa}2\). Vamos demonstrar que ela é a \(\kappa\) árvore de Suslin procurada, na extensão genérica. Nessa direção, uma observação útil é dada por:
Afirmação: Para cada ordinal \(\delta < \kappa\), o conjunto \(D_{\delta} = \{p\in \mathbb{P} : \text{ a altura de }p\text{ é estritamente maior que }\delta\}\) é denso em \(\mathbb{P}\).
Prova: Vamos verificar essa afirmação por indução sobre \(\delta\), sendo o caso inicial \(\delta = 0\) válido trivialmente. Para tanto, observamos que \(D_{\delta}\) é um aberto de \(\mathbb{P}\) para todo \(\delta < \kappa\), pois, se \(p\in D_{\delta}\), toda extensão de \(p\) tem também altura estritamente maior que \(\delta\). Logo, ao assumirmos por indução que \(D_{\eta}\) é denso em \(\mathbb{P}\) para todo \(\eta < \delta\), o exercício acima nos garante que \(D = \displaystyle \bigcap_{\xi < \delta}D_{\xi}\) é também denso em \(\mathbb{P}\). Logo, dado \(p \in \mathbb{P}\), existe \(p' \in D\) com \(p' \leq p\). Pela definição de \(p'\) deve ter altura pelo menos \(\delta\). Seja \(S_{p'}\) o conjunto de seus pontos de altura máxima. Vamos descrever uma condição de forcing \(q\) que estende \(p'\). Para cada \(s\in S_{p'}\) e cada sequência binária finita \(F\), declare \(s^{\frown}F \in q\). Mais do que isso, para cada tal sequência \(F\), fixe \(\overline{F}\) uma extensão arbitrária de ordem tipo \(\omega\) e declare também \(s^{\frown}\overline{F}\in q\). Definida dessa forma, \(q \in \mathbb{P}\) tem altura \(h_{p'}+\omega\), em que \(h_{p'}\) é altura de \(p'\). Visto que \(h_{p'}\geq \delta\), segue que \(q < p\) e \(q\in D_{\delta}\), verificando que \(D_{\delta}\) é denso em \(\mathbb{P}\). \(\square\)
Consequentemente, para todo \(\delta < \kappa\), \(1 \Vdash \dot{G}\cap \check{D_{\delta}}\neq \emptyset\), de onde segue que a altura de \(\check{T}\) é \(\kappa\). Mais do que isso, um nível \(\alpha\) de \(\check{T}\) coincide com o nível \(\alpha\) de uma árvore \(p \in \check{G} \in D_{\alpha+1}\). Como \(|p|<\kappa\) pela definição de \(\mathbb{S}\), segue que o nível \(\alpha\) de \(\check{T}\) tem tamanho menor que \(\kappa\). Vamos agora argumentar que cadeias em \(T\) têm tamanho estritamente menor que \(\kappa\). Para isso, fazemos uso da seguinte observação:
Afirmação: Seja \(s: \kappa \to 2\) uma sequência binária de ordem tipo \(\kappa\). Vamos dizer que \(p\in \mathbb{P}\)
trunca \(s\) se \(s|_{h_p}\in p\), em que \(h_p\) denota a altura de \(p\). Então, o conjunto \(E_s = \{q\in \mathbb{P}: q\text{ não trunca }s\}\) é denso em \(\mathbb{P}\).
Prova: Fixe \(p\in \mathbb{P}\) qualquer. Se \(p\) não trunca \(s\), então \(p\in E_s\) e \(p\leq p\). Suponha então que \(p\) trunca \(s\). Em particular, \(s' = s|_{h_p}\in S_p\), em que \(S_p\) é o conjunto das sequências de comprimento máximo em \(p\). Vamos agora definir \(q\) uma extensão de \(p\). Para isso, dados \(t \in S_p\setminus \{s'\}\) e \(F\) uma sequência binária finita, fixe \(\overline{F}\) uma sequência binária de ordem tipo \(\omega\) que estende \(F\) e declare \(t^{\frown}F,t^{\frown}\overline{F}\in q\). Para cada sequência binária finita \(F\), entretanto, escolha \(\overline{F}\) de forma que \(s'^{\frown}\overline{F}\) não seja um segmento inicial de \(s\). Assim, declare também \(s'^{\frown}F,s'^{\frown}\overline{F}\in q\). Com essas escolhas de \(\overline{F}\), temos que \(s|_{h_q}\notin q\), em que \(h_q\) denota a altura de \(q\). Ou seja, \(q\in E_s\) e \(q \leq p\), verificando a densidade de \(E_s\). \(\square\)
Assim, considere uma sequência binária \(s\) tal que, para algum \(p\in\mathbb{P}\), \(p \Vdash \check{s}\text{ é uma cadeia de }\dot{T}\). Se \(s\) tem ordem tipo \(\kappa\), a afirmação acima nos garante que existe \(q \in \dot{G}\cap E_s \), visto que \(\dot{G}\) é um filtro genérico. Nesse caso, se \(h_q\) denota a altura de \(q\), tem-se que \(s|_{h_q}\notin q\), de onde seque que \(s|_{h_q}\notin \dot{T}\). Portanto, devemos ter \(p\Vdash |\check{s}| < \kappa\).
Finalmente, vamos mostrar que \(\dot{T}\) não tem anticadeias de tamanho \(\kappa\), isto é, que, dado \(\dot{A}\) um nome, \(1\Vdash (\dot{A}\text{ é anticadeia maximal}) \to (|\dot{A}|<\kappa)\). Para tanto, fixe \(p\in\mathbb{P}\) tal que \(p\Vdash \dot{A} \text{ é uma anticadeia maximal}\). Declarando \(p_0 = p\) e supondo definida uma condição de forcing \(p_n\), observamos que, para cada \(s\in p_n\), o conjunto \(H_s = \{q\in \mathbb{P}: q\Vdash \check{s}\in \dot{A} \text{ ou existe }\check{s'}\text{ nome tal que } p\Vdash \check{s'} \in \dot{A}\wedge s\preceq s' \text{ ou }p\Vdash \check{s'} \in \dot{A}\wedge s'\prec s \}\) é aberto (por ser fechado para baixo) e denso em \(\mathbb{P}\). Aqui, a notação \(s \preceq s'\) indica que a sequência \(s\) é um segmento inicial da sequência \(s'\), correspondendo à ordem natural de \(^{<\kappa}2\). A densidade de \(H_s\), então, decorre da maximalidade de \(\dot{A}\) e do fato de que a fórmula \(\check{s}\notin \dot{A}\) é a negação da fórmula \(\check{s}\in \dot{A}\). Assim, pelo exercício anterior, existe \(p_{n+1}\in \displaystyle \bigcap_{s \in p_n}H_s\) com \(p_{n+1}< p\). Considere então o conjunto \(\tilde{A} = \left\{s\in \displaystyle \bigcup_{n < \omega}p_n : \exists n<\omega \phantom{i}(p_n \Vdash \check{s}\in \dot{A})\right\}\). Se \(\displaystyle \bigcup_{n<\omega}p_n\) tem altura (limite) \(\gamma\), por meio dos seguintes critérios vamos definir \(q\) uma condição de forcing com altura \(\gamma+1\) que estende \(\displaystyle \bigcup_{n < \omega}p_n\):
- Para todo \(s\in \tilde{A}\), escolhemos \(\overline{s}\) uma sequência binária de ordem tipo \(\gamma\) que a estende e declaramos \(\overline{s}\in q\);
- Se \(s\in \displaystyle \bigcup_{n<\omega}p_n\) mas \(s\notin \tilde{A}\), existe \(\check{s'}\) nome tal que \(p_n \Vdash \check{s'}\in \dot{A}\wedge s\preceq s'\) ou \(p\Vdash \check{s'} \in \dot{A}\wedge s'\prec s \), para algum \(n < \omega\). Em particular, \(s'\in \tilde{A}\). Se o primeiro caso ocorre, nada faça. No segundo caso, escolha \(F\) uma sequência binária de ordem tipo \(\omega\) qualquer e declare \(s^{\frown}F \in \omega\).
Portanto, de acordo com esta construção, os pontos de altura máxima de \(q\) possuem elementos de \(\tilde{A}\) como segmentos iniciais. Isso significa que, se \(q'\) é uma extensão de \(q\) e \(s\in q'\setminus q\), então \(s\) é comparável com algum elemento de \(\tilde{A}\), uma vez que é comparável com algum elemento de altura máxima em \(q\). Ou seja, \(q\Vdash \tilde{A}=\dot{A}\), pois \(q \leq p_n\) para todo \(n<\omega\). Como \(|\tilde{A}| \leq |q| < \kappa\), segue o resultado.