$\def\sen{\text{sen}}$
======== Fórmula de Taylor ========
{{ youtube>vEsI1TYD-tU?small}}
Uma motivação que tivemos para a definição de derivada de uma função foi aproximá-la por uma função linear: $p(x) = ax + b$. Vimos, naquele momento, que essa aproximação se dada da seguinte forma
\[P_1(x) = f'(x_0)x + f(x_0) - f'(x_0)x_0 = f(x_0) + (x - x_0)f'(x_0)\]
Claramente,
\[P_1(x_0) = f(x_0).\]
Mas, mais que isso,
\[P_1'(x) = f'(x_0).\]
Em particular, $P_1'(x_0) = f'(x_0)$. Se derivarmos novamente, teremos $P_1''(x) = 0$ - ou seja, em geral não teremos a igualdade com $f''(x_0)$. Inspirados pela igualdade acima, podemos tentar aumentar o grau de $P_1'$ e definir
\[P_2(x) = f(x_0) + (x - x_0)f'(x_0) + \lambda(x - x_0)^2f''(x_0)\]
Note que, não importa qual $\lambda$ escolhermos, já teremos $P_2(x_0) = f(x_0)$. Note também que, para qualquer $\lambda$,
\[P_2'(x) = f'(x_0) + 2\lambda(x - x_0) f''(x_0)\]
Ou seja, ainda mantemos a igualdade
\[P_2'(x_0) = f'(x_0)\]
Finalmente,
\[P_2''(x) = 2\lambda f''(x_0)\]
Ou seja, se quisermos que $P_2''(x_0) = f''(x_0)$, basta impor que $\lambda = \frac{1}{2}$.
Antes de fazer o caso geral, vamos a mais um passo. Tentando um polinômio de grau $3$, temos
\[P_3(x) = f(x_0) + (x - x_0)f'(x_0) + \frac{1}{2}(x - x_0)^2 f''(x_0) + \lambda(x - x_0)^3 f'''(x_0)\]
Derivando algumas vezes, obtemos:
\[P_3'(x) = f'(x_0) + (x - x_0)f''(x_0) + 3\lambda(x - x_0)^2 f'''(x_0)\]
\[P_3''(x) = f''(x_0) + 6\lambda(x - x_0) f'''(x_0)\]
\[P_3'''(x) = 6\lambda f'''(x_0)\]
Ou seja, se quisermos $P_3'''(x_0) = f'''(x_0)$, precisamos impor $\lambda = \frac{1}{6}$.
Com tudo isso, temos a motivação para a seguinte definição:
Seja $f$ $k$ vezes diferenciável. Então o **polinômio de Taylor** de ordem $k$ em torno de $x_0$ é dado por
\[\begin{array}{rcl}
P_k(x) & = & f(x_0) + f'(x_0)(x - x_0) + \frac{1}{2}f''(x_0)(x - x_0)^2 + \cdots + \frac{1}{k!}f^{(k)}(x_0)(x - x_0)^k\\
& = & \sum_{j=0}^k \frac{1}{j!}(x - x_0)^j f^{(j)}(x_0)
\end{array}\]
Estamos adotando a notação que $f^{(k)}$ significa "derivar $f$ $k$ vezes" - em particular, $f^{(0)}(x) = f(x)$.
Como a discussão acima indica, vale o seguinte resultado:
**Proposição** Dada $f$ $k$ vezes diferenciável, temos que
\[P_k^{(j)}(x_0) = f^{(j)}(x_0)\]
para $j \leq k$.
**Teorema (Fórmula de Taylor)** Seja $f: I \to \mathbb R$ diferenciável $n + 1$ vezes. Seja $a \in I$. Então existe $J$ intervalo aberto tal que $a \in J \subset I$ de forma que, para todo $x \in J$
\[f(x) = f(a) + f'(a)(x - a) + \cdots + \frac{1}{n!}f^{(n)}(x - a)^n + \frac{1}{(n + 1)!}f^{(n + 1)}(\sigma)(x - a)^{n + 1}\]
onde $\sigma = a + \theta(x - a)$ para algum $\theta$ tal que $0< \theta < 1$.
**Dem.:** Começamos tentando estimar o "erro" dado por $P_n$ (polinômio centrado em $a$):
\[E_n(x) = f(x) - P_n(x)\]
Note que, para cada $j \leq n$, $E_n^{(j)}(a) = 0$ e que $E_n^{(n + 1)}(x) = f^{(n + 1)}(x)$.
Considere $h(x) = (x - a)^{n + 1}$. Temos que, para cada $j \leq n$, $h^{(j)}(a) = 0$ e que $h^{(n + 1)}(x) = (n + 1)!$.
Lembrando que $E_n(a) = 0$ e que $h(a) = 0$, temos, para $x \neq a$,
\[\frac{E_n(x)}{h(x)} = \frac{E_n(x) - E_n(a)}{h(x) - h(a)}\]
Usando o [[derivada:lHopital|Teorema de Cauchy]], obtemos que existe $\sigma_1$ entre $a$ e $x$ tal que:
\[(E_n(x) - E_n(a))h'(\sigma_1) = (h(x) - h(a))E_n'(\sigma_1)\]
Substituindo acima, obtemos que
\[\frac{E_n(x)}{h(x)} = \frac{E_n'(\sigma_1)}{h'(\sigma_1)}\]
Mas daí podemos usar que $E_n'(a) = h'(a) = 0$ e obter que
\[\frac{E_n(x)}{h(x)} = \frac{E_n'(\sigma_1) - E_n'(a)}{h'(\sigma_1) - h'(a)}\]
Com argumento análgo ao acima, podemos encontrar $\sigma_2$ entre $x$ e $\sigma_1$ de forma que
\[\frac{E_n(x)}{h(x)} = \frac{E_n''(\sigma_2)}{h''(\sigma_2)}\]
Continuando desta maneira, obtemos
\[\frac{E_n(x)}{h(x)} = \frac{E_n^{(n + 1)}(\sigma)}{h^{(n + 1)}(\sigma)}\]
para algum $\sigma$ entre $x$ e $a$.
Lembrando que $E_n^{(n + 1)}(\sigma) = f^{(n + 1)}(\sigma)$ e que $h^{(n + 1)}(\sigma) = (n + 1)!$, obtemos
\[\begin{array}{rcl}
E_n(x) & = & \frac{E_n^{(n + 1)}(\sigma)}{h^{(n + 1)}(\sigma)} h(x)\\
& = & \frac{1}{(n + 1)!}f^{(n + 1)}(\sigma) (x - a)^{n + 1}\\
\end{array}\] $\square$
**Exemplo** Considere $p(x) = x^4 - 3x^3 + 5x^2 - 1$. Vamos calcular o polinômio de Taylor de $p$ de grau $4$ centrado em $2$.
Temos
\[p'(x) = 4x^3 - 9x^2 + 10x\]
\[p''(x) = 12x^2 - 18x + 10\]
\[p'''(x) = 24x - 18\]
\[p''''(x) = 24\]
\[p^{(4 + n)}(x) = 0\]
Calculando no ponto $2$, temos
\[p(2) = 16 - 24 + 20 - 1= 11\]
\[p'(2) = 32 - 36 + 20 = 16\]
\[p''(2) = 48 - 36 + 10 = 22\]
\[p'''(2) = 48 - 18 = 30\]
\[p'''(2) = 24\]
Pela Fórmula de Taylor (note que o erro é $0$):
\[\begin{array}{rcl}
p(x) & = & p(2) + (x - 2)p'(2) + \frac{1}{2}p''(2)(x - 2)^2 + \frac{1}{6}p'''(2)(x - 2)^3 + \frac{1}{24}p''''(2)(x - 2)^4\\
& = & 11 + 16(x - 1) + 11(x - 2)^2 + 5(x - 2)^3 + (x - 2)^4\\
\end{array}\]
**Proposição** Dado $p$ polinômio de grau $n \geq 1$, temos que se $P_n(x)$ é o polinômio de Taylor centrado em $a$ e de grau $n$, então $p(x) = P_n(x)$ para todo $x \in \mathbb R$.
**Dem.** Em vez de mostrar o resultado, vamos mostrar o seguinte lema (note que o que queremos provar é um caso particular):
**Lema** Se $p$ e $q$ são polinômios de grau no máximo $n$ e existe um ponto $a$ tal que $p^{(k)}(a) = q^{(k)}(a)$ para todo $k \leq n$, então $p = q$.
**Dem.:** Por indução sobre $n$. Se $n = 1$, então $p(x) = \alpha_1 x + \alpha_0$ e $q(x) = \beta_1 x + \beta_0$. Por hipótese, temos que
\[\alpha_1 = p'(a) = q'(a) = \beta_1\]
Com isso, também provamos que $\alpha_0 = \beta_0$ (usando que $p(a) = q(a)$).
Agora o caso $n \Rightarrow n + 1$:
Note que como o grau de $p'$ e $q'$ têm grau no máximo $n$ e satisfazem a hipótese do nosso enunciado. Assim, por $HI$, temos que $p'(x) = q'(x)$. A partir disso, para mostrar que $p(x) = q(x)$, basta proceder como no caso anterior.$\square$
**Exemplo** Vamos tentar aproximar o valor de $\cos(1^o)$ ($1^o$ equivale a $\frac{\pi}{180}$). Vamos calcular o polinômio de Taylor de $\cos$ de grau $2$ em torno de $0$.
Em geral, o polinômio se dá por
\[\begin{array}{rcl}
P(x) & = & f(a) + f'(a)(x - a) + \frac{1}{2}f''(a)(x - a)^2\\
& = & \cos(0) -\sen(0)(x - 0) - \frac{1}{2}\cos(0)(x - 0)^2\\
& = & 1 - \frac{1}{2}x^2\\
\end{array}\]
Calculando o polinômio em $\frac{\pi}{180}$, obtemos:
\[P(\frac{\pi}{180}) = 1 - \frac{\pi^2}{2 \cdot 180^2} \sim 0,9998476912901\]
Sabemos que o erro (dado pela fórmula de Taylor) é dado por
\[\begin{array}{rcl}
E(x) & = & \frac{1}{6} f'''(\sigma)(x - a)^3\\
& = & \frac{1}{6} x^3\sen(\sigma)\\
\end{array}\]
para algum $\sigma$. Lembrando que $|\sen(x)| \leq 1$, calculando no ponto $\frac{\pi}{180}$, obtemos:
\[\begin{array}{rcl}
|E(\frac{\pi}{180})| & \leq & \frac{\pi^3}{6 \cdot 180^3}\\
& \sim & 0,00000086\\
\end{array}\]
De fato, usando alguma "calculadora potente", obtemos que $\cos(\frac{\pi}{180}) \sim 0,999847695156$.